segunda-feira, 20 de julho de 2015

Sr. Dix e a Estranha Abdução da Garota que Ninguém Conhece




Primo Dix manejou suavemente os controles de sua nave, aterrissando com um silêncio digno de um prêmio no jardim calmíssimo de uma pequena casa em São Paulo. Ele abriu a rampa de saída e um pouco da névoa do plasma do motor se avolumou por sobre a grama.
Escondeu-se atrás de uma grossa árvore nativa e ativou o modo de invisibilidade de sua nave, admirando o interior da casa. Ele tinha interceptado sem querer um sinal da Segurança do Conselho Intergaláctico que apontava diretamente para a direção daquela casa sem graça e estranhando o que alguém que morasse ali pudesse significar para o onipotente Conselho, ele se sentiu na obrigação de espionar.
Um momento depois e ele assistiu um grupo em um SUV invadir a casa e logo depois levar uma moça desacordada consigo. Seu escâner de assinaturas magnéticas apitou e ele decodificou facilmente o sinal que estava sendo enviado para a localização, fazendo um arrepio estranho invadir a corrente sanguínea de Dix.
Ele digitou manualmente o código da assinatura no Almanaque do Universo e rapidamente um nome surgiu, mostrando a foto nada amigável de Juniper Lokason — um homem ruivo, nos meados dos seus trinta anos, com um nariz do tamanho de um planeta e um ego que dificilmente caberia nesse mesmo planeta.
O problema em questão não era seu ego de dimensões admiráveis, mas o fato de que ele era um dos feiticeiros mais diabólicos que a galáxia já tinha conhecido, um pouco mais que Darth Vader e um pouco menos que a Bruxa Má do Oeste. Ele fechou seu Almanaque e esperou o silêncio reinar novamente, invadindo a casa à passo leves.
Todos os humanos da casa ainda dormiam como se nada tivesse acontecido. Aquela menina iria entrar para a lista de desaparecimentos inexplicáveis e a polícia com o tempo iria convidar o casal a simplesmente esquecer o caso. Curiosamente, quando ele entrou em seu quarto percebeu que seu notebook estava aberto em uma notícia cujo título dizia que a Nasa acusava um alienígena de estar disfarçado no Brasil se escondendo.
Dix riu suavemente, podia apontar uns trinta mil sujeitos que não tinham nascido na Terra e estavam passeando felizes e contentes pelo Brasil, com a desculpa de serem turistas. Nada que um aplicativo de linguagem não resolvesse e aprender português era ridiculamente fácil.
Dix, como todos esses caras felizes, não tinha nascido na Terra, o que não o impedia de dar umas voltinhas pelas bandas e provavelmente não era o único naquele momento à fazer uma pequena visita à São Paulo por conta daquela perturbação causada pelo furacão Juniper.
Ele puxou seu controle portátil da nave e ordenou:
— Computador, encontrar presenças alienígenas da União Yggdrasil nas proximidades, respeitar raio de dez quilômetros — quando ele terminou, o controle acionou uma luz verde, sinalizando que estava acatando a ordem.

— Há alguma distância dali —

Os passos ecoaram pelo silêncio úmido da rua sem saída, cercada de prédios velhos e saídas ainda mais velhas, enquanto espirais de vapor emergiam dos bueiros e dos encanamentos expostos. Os últimos resquícios de uma garoa fina se avolumavam pelos cantos das calçadas e escorriam entre os tijolos.
Lugus Calandra, também nem perto de ter nascido na Terra, puxou seu escâner de calor de dentro do bolso de seu casaco e vasculhou o local, procurando pelos guardas escondidos nos cantos, detectando as manchas vermelhas amareladas atrás das paredes, caminhando nervosamente de um lado para o outro no espaço limitado onde estavam temporariamente trancados.
Uma das manchas permanecia estável, provavelmente deitada em uma cama e expondo um marcador, que mostrava que era essencialmente nessa que estava interessado.
Seu rosto era protegido por uma barreira de energia que lhe fornecia oxigênio, informações e características dos objetos que o rodeava e o modo como seus olhos giravam imensamente azuis de um lado para o outro demonstrava que seu ultimo interesse era justamente os perigos que aquele lugar poderia lhe oferecer.
Às suas costas um segundo homem se aproximou, com cabelos castanhos que desciam sobre seus ombros, orelhas pontudas e traços fortes. Seus olhos castanhos desceram sobre a imagem do escâner e suas sobrancelhas se franziram.
— Ela está lá dentro — ele disse à Lugus — está cercada por três guardas com armamento classe 5. Seus sensores estão ligados?
— Sempre Galather — o loiro sorriu, movendo seus olhos impressionamente azuis para o outro — vou entrar — e puxou do coldre pendurado em seu quadril o punho prateado de uma espada, acionando os botões corretos e liberando a lâmina laser.
Antes que o outro pudesse responder, ele se encaminhou para a porta a sua frente, expulsando alguns gatos de seu caminho e com um golpe pesado de seu pé sobre o metal a porta pendeu sonoramente para o chão, chamando a atenção dos guardas no interior do prédio.
Só precisou de alguns segundos para que seus sensores os detectassem, analisando suas possíveis fraquezas. O som de uma metralhadora sendo engatilhada chamou sua atenção e um pequeno momento depois os tiros foram cuspidos pela arma.
Moveu-se, girando a espada em seu punho, acionando um comando e liberando um escudo de proteção que derretia as baldas que vinham em seu caminho. Às suas costas duas esferas de plasma assoviaram pelo ar, cortando a sala e se chocando contra os outros dois guardas restantes.
Os seus corpos penderam frouxamente para o chão e o que ainda se mantinha em pé moveu a metralhadora com ainda mais desespero.
Quando ele mudou a direção dos tiros para fora de seu alcance, balançando a arma, Lugus saltou girando a espada no ar e com um golpe gracioso, a cabeça de seu inimigo foi cortada de seu pescoço, rolando pelo chão até se juntar aos outros corpos.

­— / —

Dix assistiu admiradamente enquanto dois elfos carregavam a moça para fora e embarcavam em uma nave feia demais para ser verdade, sem que ninguém na metrópole percebesse e literalmente por cima dos cadáveres da Segurança Intergaláctica. Puxou o controle portátil e acionou a câmera e filmou toda a abdução.
Quando estava pronto para devolver o dispositivo ao seu bolso, ele sentiu o cano gelado de uma arma se encostar ao seu pescoço rigidamente e ele virou apenas um pouco seu rosto, com um sorriso constrangido para saber quem pretendia matá-lo. Um dos agentes da Segurança que tinham invadido a casa da garota lhe lançou um olhar de profunda raiva.
— Me passe esse celular estranho — e ergueu a mão, onde Dix colocou o dispositivo sem pressa — conhece aqueles malditos alienígenas? — Ele lançou um olhar para a nave que já desparecia no escuro da noite e Dix lhe sorriu um pouco mais feliz agora.
— Que tal minha liberdade pela informação? Começando por tirar essa pistola da minha nuca?
D. abaixou a arma desgostosamente.
— Aqueles dois elfos são da União Yggdrasil e acho que estão levando aquela garota justamente para quem vocês estavam loucos para mantê-la longe.
O que? — D. engasgou — mas não sabemos ainda o que está acontecendo.
Dix deu de ombros suavemente e ajeitou seu terno em desalinho.
— Acho que estamos prestes a descobrir do pior jeito.


Claro que não é o Fim